quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Morte ao Rei - 2003

Como nesse semestre iremos estudar Hobbes há cadeira de filosofia moderna achei oportuno essa postagem

O filme “Morte ao Rei” à luz de Hobbes, por Gills Lopes e Joseildo Lima



Morte ao Rei
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O filme “Morte ao Rei” retrata uma Inglaterra em fúria interna, onde é possível identificar alguns ensinamentos deixados pelo filósofo político Thomas Hobbes. Pelo fato de o enredo do filme se passar no mesmo período em que o teórico inglês viveu (por volta de 1645), torna-se cristalina a importância daqueles momentos de conflitos civis e de choques de interesses (sobretudo entre burguesia e mornarquia) que tanto influenciaram Hobbes. Ademais do legado hobbesiano, logicamente, é possível traçar a importância dos personagens principais, Oliver Cromwell e Thomas Fairfax, na condução da história política inglesa. Todavia, este texto versará – breve e diretamente – sobre as mais importantes correlações entre o filme e as teorias hobbesianas.



MORTE ao rei. Direção: Mike Barker. Intérpretes: Tim Roth, Dougray Scott, Rupert Everett e outros. Alemanha e Inglaterra: Flashstar Home Vídeo, 2003. 1 DVD (102min), color.



O Estado de Natureza


O Estado de Natureza de Hobbes consiste num cenário social igualitário em que o indivíduo – livre de valores reguladores – não é regido e/ou ordenado por nenhum governo externo a ele (Leviatã). O período vivido pela Inglaterra do filme “Morte ao rei” não se enquadra neste estado de coisas hobbesiano. Pelo contrário, tal período narrado se enquadra no Estado Civil, ou seja, no contexto do filme, a sociedade tem um contrato firmado com o Estado, na figura do rei a ser deposto. Contrato este que torna a mesma sociedade abdicante de parte de sua liberdade. O fato de essa mesma sociedade tentar romper tal contrato com o reinante não implica dizer que ela deseje parte de sua liberdade de volta ou, então, retornar ao Estado de Natureza.

Portanto, chega-se a conclusão de que a perda de parte da liberdade e retorno ao Estado de Natureza só ocorre momentaneamente quando o rei deixa de cumprir com sua parte no acordo – quebrando assim o princípio do Direito Civil conhecido como pacta sunt servanda: o monarca presta mais “atenção” às suas próprias pessoa e necessidades do que nas dos seus. Logo, o período predominantemente narrado no filme está dentro do Estado Covil e não do seu estado predecessor, o Estado de Natureza.

O jusnaturalismo hobbesiano


O jusnaturalismo proposto por Hobbes é, grosso modo, uma justificativa para se compreender como é engendrado e como se manifesta o Estado. Tal modelo possui dois elementos fulcrais: o Estado de Natureza e o Estado Civil. Modelo este que também se justifica na concepção do Estado de Natureza como ponto de partida para a formação do Estado.

Nesse sentido, o jusnaturalismo se diferencia do Estado de Natureza por que, além deste estar concebido naquele, o jusnaturalismo carrega um princípio revestido de poder – que pode ser a vontade divina, a natureza ou a razão – que regula, através de nromas, o agir dos indivíduos. Normas essas que não figuram no Estado de Natureza, já que o indivíduo e livre para fazer o que bem entender, no sentido de se manter vivo – até mesmo matar. Sem mencionar, também, o fato de que o primeiro é um conceito jurídico e o outro, político.

Período do filme e ensinamentos hobbesianos


Isso exposto, pode-se dizer que o Estado de Natureza concebe ao indivíduo a autoarbitrariedade para fazer e pensar o que bem entender, já que o mesmo é imbuído de liberdade. Mas o próprio Hobbes sabia que a partir do momento em que os homens se tornam sociáveis, seus desejos ganham restrições, pois ninguém pode ter tudo e nem tudo pode ser só de uma pessoa. Logo, tal liberdade esvai-se no ar, através do Contrato Social.

No período em que Hobbes viveu (1588-1679), ou seja, num cenário de guerra civil e baseado naquilo que a supracitada película mostra, se percebe que o soberano, ao romper um contrato previamente acordado com outros indivíduos (hierarquicamente, abaixo dele), concomitantemente, faz com que esses indivíduos resgatem momentaneamente seu Estado de Natureza, pois ao “sentir” que o Estado, na pessoa do monarca, não mais lhes garantia segurança, eles rompem também com o Estado Civil e passam a agir conforme as leis e diretrizes incutidas em suas próprias razões e não mais com a “cabeça” do rei – outrara ungida pelas mãos do Papa.

Parafraseando o próprio Hobbes, “o justo valor é aquele que as partes estão de acordo em concertar” (HOBBES, 2004, tradução nossa), observa-se que, no filme ora em análise, se o rei estivesse indo de acordo com o Contrato, certamente não haveria motivos para depô-lo – tendo, sempre, o ponto de vista dos parlamentares. E, noutra passagem, Hobbes afirma que
um soberano absoluto que se origina de um contrato deve racionalmente ser obedecido porque a justiça requer dos homens que cumpram seus contratos, e a única base racional para a desobediência é a de que o soberano tenha falhado em proporcionar a satisfação a que ele foi autorizado. (op. cit.)

Isso lança questão em saber se Hobbes não justifica, assim, a decapitação do rei, à época.

Uma analogia às ideias freudianas é deveras oportuna, aqui: a perda da liberdade está intrinsecamente ligada à repressão dos desejos. Em outras palavras, reprimir o desejo, para Freud, é o mesmo que uma das partes contratadas não desempenhar seu papel: ou o rei priva a liberdade (omitida no Contrato) dos súditos, através de atos por eles não esperados, ou o s súditos se rebelam contra o rei sem uma razão uníssona e agravante. Esta última não se percebe, no filme, já que o rei Charles I não apoia as reformas essenciais para o ressurgimento de uma nação recém-saída de um período de pós-guerra civil devastador.

Logo, percebe-se que o que os parlamentares queriam, ao dar um fim momentâneo ao absolutismo na Inglaterra, não se insere no “estado de guerra” hobbesiano, pois o que os revoltosos desejavam era “reformular” o Leviatã – ainda que às rédeas de uma nova classe burguesa que crescia – e não se livrar dele (afinal, a manutenção do poder, conforme demonstrado pela história, depende de um aparato burocrático controlado por uma elite). E isso, o filme demonstra com maestria.

Referências



HOBBES, Thomas. Hobbes’ Leviathan reprinted from the edition of 1651 with an essay by the late W.G. Pogson Smith (1909). [S.l]: The Online Library of Liberty, 2004. Disponível em: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/Hobbes_Leviathan_1909.pdf. Acesso em: 2 dez. 2010.

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