Encontrei esse texto bem no início do meu curso de filosofia e achei muito interessante, simples e que de certa forma me encorajou a ir em frente.
Viver é realizar sonho. Tudo oque hoje faço é pra materializar minhas fantasias de infância. obviamente, algumas coisas não posso mais fazê-las realisticamente. Ser astronauta ou casar-se com a Margareth, por exemplo. No primeiro caso, o Marcos Pontes chegou primeiro. E no segundo, margô partiu deste mundo antes que pudesse me declarar pra ela.
Mas o resto, acredito que será fácil. Lutar caratê e tocar violão são as que ame lembro agora como as mais importantes. Ser um herói dos quadrinhos é mais ou menos como ser juiz ou promotor, estou me esforçando. Meu sonho de ter a minha própria máquina de fliperama foi um dos primeiros a ser realizado.
Alguns sonhos incorporei com maior idade. Por exemplo estudar filosofia. Sim, porque chegar a ser filósofo é muito difícil. Deve-se estudar outras línguas, inclusive antigas e mortas, ler textos quase incompreesíveis muitas vezes contraditórios. Ele brotou em mim na adolescência quando ouvi falar de sartre.
Acho que foi aos catorze anos que li " A Idade da Razão" e fiquei emprisionado com a descrição do absurdo da existência mostrada ali. Lembro-me de uma parte da historia em Mathieu (será esse o nome?) está em um bar com Ivicht por quem é loucamente apaixonado. Ela o desafia a cravar uma faca na palma da própria mão. Os idiotas o fazem. no fim ele a perde por um motivo singelo: ela muda de cidade com a família.
Depois resolvi ler um texto mais filosófico de Sartre. O Existencialismo É Um Humanismo foi fácil. Mas quando eu cheguei em Questão de Método, enorme foi o sofrimento. Depois de ler e reler umas dezessete vezes, fiz um resumo do texto. Sartre estava pela primeira vez se declarando marxista.
Ai conheci uma garota "existencialista". Pelo menos era assim como eu a via. Ela era bonita e tinha olhos grandes e tristonhos. Deixei de namorá-la por timidez. Mas agora ela estava para prestar vestibular e me entusiasmou. Passei em filosofia e ela levou pau em arquitetura. Nos separamos e nunca mais a esqueci. Superei pensado que ela tinha a cabeça muito grande, era depressiva, e nosso caso não teria dado certo.
Na filosofia, a primeira disciplina foi com um ex padre, Rosacruz, que nos fez ficar um semestre inteiro nas cinco primeiras páginas do Padovani. O resto do tempo passou contando histórias de suas aventuras pelo mundo, desde que deixou a Itália. Posteriormente descobriu que um outro professor, este um padre doutor, era seu inimigo e ao chamava de mentiroso. E ainda nos exortava: " o problema de mentir é que a mentira vicia, meninos. Não fiquem iguais a certas pessoas qui do curso".
Nossa "turma" era composta de cinco alunos. Inicialmente eram treze, mas ainda no primeiro período oito desembarcaram quando descobriram oque era filosofia. O único normal era eu, acreditem. Os demais eram malucos. Um era comunista de farda. Outro era inventor com cinco mil patentes. Tainha um evangélico que ficou até o fim do curso sem saber oque fazer ali. O último, descobrimos depois, era um major da PM infiltrado entre nós.
No início foi realmente um saco o estudo daquelas coisas platônicas, o supremo bem, a causa primeira, as categorias, o mundo das idéias. Depois a filosofia medieval, com Santo Agostinho, Tomás de Aquino, Duns Escoto, putz. A única animação das aulas eram os bate-bocas entre o comunista e o professor padre, este eventualmente ajudado pelo evangélico.
A coisa começou a ficar boa no curso de filosofia quando entraram em cena os ateus. Nietzsche, Freud, Heidegger, Schopenhauer e etc. Por fim, chegou um padre - metade do corpo docente era composta de padres, e o resto era ou pastores evangélicos ou ateus, meio a meio - que me deixou fascinado por sua inteligência e quase me converter ao catolicismo.
Eu havia me decidido a ser ateu, por influência do comunista, de quem eu me tornava amigo. Mas confesso que a leitura moralista feita por Adorno e Horkheimer na Dialética do Esclarecimento me mostrava um mundo tão realmente dominado pelo mal, que evocava em mim pavorosas passagens bíblicas. Tomei porres enormes, passei noites mal dormidas, igual ao que aconteceu ao aluno de Hegel quando finalmente conseguiu compreender a filosofia de Hegel.
Mas eu sobrevivi e apresentei minha monografia para receber meu título de bacharel. No dia da apresentação encontrei adivinhem quem? Ela, a garota existencialista. Havia passado em sociologia e estava começado seu curso. Foi um baque vê-la. Mas eu já estava casado com dona Maria do Carmo Ferreira de Albuquerque Lima e aquela história já virara passado remoto. Devo dizer que ela estava mais bonita do que antes e sua cabeça não era tão grande como eu imaginava.
Postagem original http://www.recantodasletras.com.br/redacoes/1897447
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